parent nodes: Dicionário de Símbolos | Édipo | Fichas em ordem cronológica | Fichas por assunto | Fichas por ordem alfabética | Herói | Narratologia, fichas de leitura relacionadas


Feijó, O que é herói




index do verbete

PARTE I O NASCIMENTO DO HERÓI, SE DEU COM O MITO


1 O nascimento do herói, se deu com o mito. O mito corresponde às crenças de um povo. (pág. 13) (...) Os mitos refletem sempre um medo da mudança.

2 As sociedades primitivas (denominadas de “arcaicas”) procuram num tempo longínquo (na chamada “idade mítica”) aquilo que julgaram ter pedido: a verdade eterna. Esta se encontraria num passado tão distante que não dá nem para se medir. A procura dela envolve ritos, cultos e lendas, como se isso permitisse o seu retorno. É o mito do eterno retorno. Isto tudo refletindo um “horror da história” de uma sociedade em transformação que se assusta com as mudanças. O mito seria, então, um consolo contra a história. E o herói, um consolo contra a fraqueza humana. (...)

3 A mitologia grega compreende três grandes ciclos (“ciclo teogônico”) (pág.13) (...) (“ciclo olimpiano”) (“ciclo heróico”) (...) pode ser resumida na vida dos deuses e heróis, sendo que os deuses tinham características humanas, como vícios e virtudes, e os heróis tendo características divinas, com poderes especiais, embora fossem mortais. (pág.14) (...)

4 Alguns estudiosos defenderam a idéia de que esses heróis tinham sido indivíduos destacados em suas sociedades e que a imaginação coletiva acabou por dotá-los de poderes extra-humanos. Alguns também defenderam que os heróis eram deuses rebaixados; isto é, divindades de povos submetidos por outros que teriam perdido a condição de deuses. (...)

5 Pensador Evêmero (século III a.C); evemerismo. (...) O mito teria nascido da história real e o herói era o que restou e algum individuo destacado. (pág. 17) (...)

A. - CICLO HERÓICO DOS WINNEBAGOS


6 Paul Radin, 1948. o Ciclo Heróico dos Winnebagos, seus mitos heróicos apresentavam quatro estágios, em cada estágio um tipo de herói.

7 O primeiro estágio é o herói do tipo rudimentar, arruaceiro, instintivo, desinibido, infantil e trapaceiro. Cínico e cruel. Trickster. Dionísio, Macunaíma. (pág.18) (...)

8 O segundo tipo é o herói fundador da cultura nativa, o transmissor das ervas medicinais, o Hare. É o herói que transmite alguma coisa aos homens. Prometeu, Orfeu, Narciso.

9 O terceiro tipo, o herói valente, o guerreiro, o fazedor de façanhas, Red Horn, Hércules, Aquiles, Ulisses.

10 O quarto tipo é muito parecido com o terceiro só que em dose dupla, são heróis gêmeos (os Twins), mas diferente em caráter. (pág. 19) (...)

B. - MAS POR QUE TANTA SEMELHANÇA?


11 Uma parte da resposta é que ela não está fora do homem: está dentro.

12 Freud chamava essas manifestações de “resíduos arcaicos”. Jung as chamou de arquétipos ou “imagens primordiais”.

13 O arquétipo é uma tendência do instinto, não da razão, manifestada pelos sentidos, não pelo conhecimento. (pág. 20) (...)

14 Mas a trajetória do herói atravessa o mito e entra na história: é o herói se separando. (pág. 21) (...)

15 Com o surgimento do Estado, o herói, ultrapassando o mito, atingiu uma nova dimensão: o herói histórico.

16 A classe social dominante exerce o seu poder pelo controle da economia, da política e até do imaginário, através da Ideologia. Nesse processo o herói torna-se figura real, palpável da História. (pág. 22) (...)

17 Alexandre da Macedônia é um exemplo que do real deu origem ao imaginário (nos moldes mitológicos), mas que acabou sendo racionalizado uma perspectiva histórica. (pág.25) (...)

18 Na Idade Média, um tipo de herói histórico misturou o mitológico e o sagrado: os “santos”.

PARTE II GÊNIO E HERÓI


19 Idade moderna (séculos XV-XVI) (pág. 26) (...)

20 Maquiavel defende a importância do monarca, do condottiere (pág.27) (...) Ele é um defensor de um monarca, que tenha “virtudes”. Um herói, enfim. (pág. 28) (...)

21 A história oficial registrou os heróis oficiais, os heróis da classe dominante: reis, generais, empresários e guerreiros. Desta forma, herói seria um privilégio de classe, não fossem a memória, a história recordada, as versões, as baladas sobre os bandoleiros: heróis populares. (pág.29) (...)

C. - BANDOLEIROS: HERÓIS POPULARES


22 Robin Hood não foi o único. Bandidos para as classes dominantes. Heróis para as classes dominadas.

23 Representam sempre uma sede de justiça coletiva. Esse tipo de manifestação apareceu sempre que um sistema agrário entrou em crise sem que houvesse uma economia urbano-industrial que absorvesse esse contingente de população marginalizada ou uma possibilidade histórica de revolução social.

24 Pancho Villa. “Lampião”. (pág. 31) (...)

PARTE III O CULTO DO HERÓI: CARLYLE


25 Século XIX, a história se resume na biografia dos heróis, sua tese: a necessidade do “culto ao herói”, o herói tem um papel estabilizador, e uma Heroarquia (governo de heróis) evitaria as transformações revolucionárias e seria uma garantia contra a Anarquia. (pág. 33) (...)

26 Defendeu um caráter divino nos heróis e que uma sociedade fundada em seu culto seria estável e respeitaria a hierarquia como coisa sagrada.

27 Teoria da “divinização do chefe político”, fundamento do fascismo. (pág. 34) (...)

PARTE IV O QUESTIONAMENTO DO HERÓI


28 Filósofo Hegel, indivíduo histórico universal.

29 Favorável às transformações históricas. Estas não são conseqüência da ação de heróis, mas das necessidades de um tempo. O “individuo histórico-universal (o herói) seria o que compreende as condições maduras e encarnaria na sua liderança aquilo que sua época determinasse. (pág. 35) (...)

30 Herói, o instrumento das forças históricas e sociais.

31 O marxismo considerou esta uma questão menor ou a deixou entregue aos conservadores.

PARTE V O MARXISMO, O INDIVÍDUO E A HISTÓRIA


32 Socialismo. Nessa história não haveria heróis. A história seria tarefa de uma classe, de um povo. (pág. 37) (...)

33 A alienação é fruto dessa “separação” do indivíduo da história.

34 A crença na capacidade do herói em fazer a história é sempre a desconfiança com relação à capacidade dos indivíduos de se organizarem para tingir seus fins. A espera do herói é sempre a espera de que “outro” faça por nós o que nos consideramos incapazes de realizar. A quem interessa isso?

PARTE VI O HERÓI REVOLUCIONÁRIO


35 As revoluções do século XX, a liderança quase sempre esteve nas mãos de um pequeno grupo organizado. Originaram-se dois novos tipos heróicos: o de partido e o guerrilheiro. (pág. 39) (...)

36 Revolução Russa, centralismo democrático, poder centralizado. (pág.40). Culto à personalidade do guia Stalin.

37 Do culto ao partido ao culto ao chefe do partido foi um passo, e o marxismo (antiutópico e antiheróico) foi quase transformado em ideologia, igual às que criticava impiedosamente.

38 O culto ao herói sempre foi uma plataforma conservadora. (pág.41) (...)

39 Che Guevara. O herói acabou ofuscando o revolucionário e suas idéias ficando em segundo plano diante da mística que se criou. Essa imagem o torna um inofensivo prato pronto para ser consumido e assim eliminado pela segunda vez: mito mistificado.

40 O revolucionário transformado em herói volta-se contra ele mesmo. (pág. 45) (...)

PARTE VII MITO DO HERÓI BANDEIRANTE.


41 A ação dos bandeirantes era puramente predatória. Porém, no século XIX, quando se consolida em São Paulo uma aristocracia, se cria também um mito. Ideologia: a de que essa classe tinha como antepassados figuras heróicas e desbravadoras. (pág.47) (...)

PARTE VIII MITO MISTIFICADO


42 O herói nasceu do mito. Da separação do mito e da alternação da realidade nasceu o herói na história.

43 O herói na história ganha foros de verdade, separa-se do mito, da poesia, da imaginação e serve à ideologia dominante.

44 Assim como a crença no herói histórico significa a espera do herói redentor, que nunca chega. (pág.49) (...)

PARTE IX A INICIAÇÃO DO HERÓI: LITERATURA


45 O ritual da iniciação, passagem de um estágio para outro.

46 Na nossa cultura a iniciação se dá por transferência de emoções, através da literatura. (pág.51) (...)

D. - O HERÓI ÉPICO


47 São os poetas que dão forma artística às crenças, aos mitos, aos anseios e desejos coletivos. Às vezes, são até os criadores de mitos, dando expressão ao inconsciente coletivo. Herói, categoria estética, o poeta a partir dele busca a compreensão da essência humana. (pág.52) (...)

48 É muito sutil a diferença entre o herói mitológico (no qual somente as façanhas e os super poderes é que contam) e o herói épico (que já apresenta características humanas). (pág.55) (...)

49 A qualidade principal do herói épico era areté (virtude): aquele que se mantém fiel a si mesmo. (pág.56) (...)

E. - O HERÓI TRÁGICO


50 O teatro nasceu no momento em que esses ritos deixaram de ser espontâneos e passaram a ser encenados, apresentados a um público passivo, que se envolve na cena de outra forma: pelo envolvimento emocional catarse.

51 Ésquilo o teatro passou a ter autonomia do ritual e o herói do teatro começou a abandonar a esfera do mito para atingir a esfera do humano. O envolvimento emocional (a catarse) da platéia não será mais pela religiosidade, mas pela identificação profunda com o destino do herói. (pág.59) (...)

52 No mito, o destino é alheio à vontade humana. No caso do mito de Édipo, ele predomina sobre tudo.

53 Diferente da estrutura do mito narrado, o que a peça mostra é a descoberta de Édipo de sua verdadeira identidade. O que há de misterioso e mágico na versão mítica transforma-se em profundamente humano na versão teatral da tragédia de Édipo.

54 Cego e sem poder, o herói trágico havia descoberto sua identidade.

55 No mito, o que prevalece é o destino, do qual nenhum homem escapa; na tragédia, o que se destaca é a luta do herói contra o destino. O herói trágico é derrotado diante da força do destino, mas o que humaniza, é exatamente a sua luta contra isso.

56 O herói trágico não se conforma com o seu destino. Esta é a sua essência. (pág.60 e 61) (...)

F. - O NASCIMENTO DA LITERATURA


57 Na literatura, o destino do herói é a sua iniciação: a descoberta de si mesmo.

58 O herói continua visitando os infernos, mas principalmente passeia sobre sua própria alma.

59 A história da literatura é a história da passagem do herói divino para o herói humano: a personagem. Não é casual que o primeiro herói realmente literário tenha sido o próprio autor: Dante Alighieri.
§ 1. Dante

60 Morreu em 1321. (pág.62 e 63) (...)

61 Non Moribus, não de Costumes.

62 Enquanto a tragédia começava leve e terminava pesada, a comédia ia do pesado (inferno) para o leve (paraíso). (pág. 66) (...)

63 A iniciação da vida plena obriga o herói a passar pelo inferno. (pág.67) (...)
§ 2. Cervantes

64 Morreu em 1616. (pág.68) (...)

65 Dom Quixote. É o herói do romance moderno: tem fé, num mundo sem fé e luta contra o que não existe mais. Um herói deslocado. Monteiro Lobato, chegou a comparar o herói tradicional na figura de Hércules, com o herói moderno na figura de Quixote: o primeiro só bate, o segundo só apanha.
§ 3. Ortega y Gasset, 1914,

66 Definiu o herói moderno, é aquele que quer ser ele mesmo ou aquele que tem vontade de ser aquilo que na verdade não é.

67 Não realiza façanhas, mas quer realizá-las e não consegue.

68 Lukács característica principal do herói na literatura moderna o seu caráter “problemático.”

G. - O HERÓI JOVEM


69 Movimento cultural na Alemanha do século XVIII (Tempestade e ímpeto) (pág. 69 e 70)

70 É no Werther, de Goethe que o herói se faz jovem.

71 Werther sofre de várias formas; mas a mais trágica dor é a sua falta de coragem de declarar seu amor. (pág.71) (...)

72 No final, quando tudo está propenso a um desfecho onde o desejo motivo do sofrimento se realizaria plenamente, a “moral” vence e Werther não tem outra saída a não ser o suicídio. (pág.72) (...)

73 O vermelho e o Negro de Stendhal. Julien Sorel, que vive dividido entre a vida mundana e a batina, se apaixona, mas a perspectiva da carreira é mais forte e ele abandona a amante. (pág.73) (...)

74 É um outro lado do herói com o qual a juventude se identifica: a conquista de um espaço numa sociedade corrompida.

PARTE X A VOLTA DO HERÓI GUERREIRO


75 Século XIX, romance histórico, Walter Scott, morreu em 1812, sua busca no passado visava condenar a sociedade presente. (pág.74) (...)

76 Herói guerreiro, justiceiro, corajoso e generoso. Há uma diferença entre esses heróis e os da poesia épica. Eles não contam com a ajuda divina, nem são perfeitos, procuram ser humanos, procuram ser históricos, verossimilhança de seus personagens, próximos da média dos homens. (pág.76) (...)

PARTE XI SÉCULO XX: O HERÓI CRÍTICO


77 Todos esses heróis apontados estão presentes na literatura contemporânea, apesar de que esta ganhou um componente muito próprio: a crítica.

78 O herói se tornou um motivo de reflexão. Até sua existência foi questionada. (pág.77) (...)

§ 4. James Joyce (1882-1941)


79 Joyce era nacionalista e conservador; Brecht era revolucionário e comunista. (pág.78) (...)

80 Ulisses publicada em 1922, refere-se ao poema Odisséia.

81 A ação se passa. O ponto alto da iniciação do herói: o seu dia-a-dia comum. O herói atinge o limite de sua iniciação. (pág.79) (...)

82 O heroísmo literário do século XX veio a ser isto: o herói se descobre no seu cotidiano anti-heróico. (pág.80) (...)

§ 5. Bertolt Brecht (1898-1956)


83 Não existem heróis positivos, mas seres humanos que se transformam e adquirem confiança ou se degradam e perdem a bondade, mas nunca como heróis definitivos. (pág.81) (...)

PARTE XII O RETORNO DO HERÓI: INDÚSTRIA CULTURAL


84 A concentração econômica implicou também a concentração dos meios de comunicação Indústria Cultural, geradora da cultura de massas.

85 Nivela tudo por baixo e oferece um produto cultural facilmente assimilável, mas também descartável. Manipulação das informações até o controle do imaginário. (pág.86) (...)

86 Nela se encontra a mitologia de nosso tempo.

H. - A VISUALIZAÇÃO DO HERÓI

§ 6. Quadrinhos desenhados (...) (pág.87)

87 Na década de 20, três tipos de heróis: o romântico herói selvagem, o moderno e urbano detetive e o herói espacial extraído da ficção científica.

88 As histórias de amor, as novelas de cavalaria se mesclam com a ficção científica) com uma “luta cósmica entre o bem e o mal”. (pág.88) (...)

89 A explosão dos heróis se deu com Super-Homem, no ano de 1938. O que explica esse sucesso numa sociedade massificada como a nossa, o individuo se sente anulado. (pág.91) (...)

90 Profunda insegurança, esconde por trás do Super-Homem um tímido e desajeitado jornalista subalterno contribuindo para uma identificação. O anônimo individuo massificado projeta seus anseios inconscientes e esquece sua impotência.

91 Não dá para igualá-los aos mitos das sociedades primitivas pela simples razão de que nessas os indivíduos tinham seus heróis como reais (só que num outro tempo e espaço).
§ 7. Cinema

92 Outro “reservatório de mitologia” é o cinema, em escala industrial. (pág.92) (...)

93 Três são os tipos de heróis do cinema: o herói tradicional, John Wayne, rebelde e o anti-herói, Humphrey Bogart. (pág.93) (...)

94 Herói rebelde, rebelde sem causa.

95 O herói é jovem e não tem um objetivo definido; sabe que sofre as conseqüências de uma situação que ele não criou e por isso se rebela, mesmo não sabendo o que colocar no lugar do que é contra. (pág.94) (...)

96 No super-herói o individuo massacrado e massificado projeta aquilo que ele não é. No herói rebelde, o jovem descobre o que ele é.

97 Um herói cultural, ele transmite algum valor ou conhecimento, mas não é ele que transforma a realidade. (pág.95) (...)

PARTE XIII BIBLIOGRAFIA


98 Feijó, Martin Cezar. O que é herói. Rio de Janeiro : Brasiliense, 1984.


19/04/2013 10:25
ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
INI | ROL | IGC | DSÍ | FDL | NAR | RAO | IRE | GLO | MIT | MET | PHI | PSI | ART | HIS | ???